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Nossa Senhora de Fátima, as aparições que mudaram a história – 13 de Maio

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Era uma Senhora vestida de branco, mais brilhante que o sol, espargindo luz mais clara e intensa que um copo de cristal cheio de água cristalina, atravessado pelos raios do sol mais ardente. Seu semblante era de uma inenarrável beleza, nem triste, nem alegre, mas sério, talvez com uma suave expressão de ligeira censura…

As aparições de Fátima

13 de maio de 1917. Lúcia de Jesus, 10 anos, Francisco Marto, 9 anos e Jacinta Marto, 7 anos, após a Missa na igreja de Aljustrel, lugarejo de Fátima, foram pastorear o rebanho de ovelhas nas terras do pai de Lúcia, na Cova da Iria.

Após um como que clarão de relâmpago, num céu luminoso e sereno, sobre uma carrasqueira de metro e pouco de altura apareceu-lhes a Mãe de Deus.

Nossa Senhora de Fátima - Dogmas marianos - Maria nunquam satis - Revista Arautos do Evangelho - Revista Católica - Aparições em Fátima - 13 de maio - A Treze de Maio

Segundo as descrições da Irmã Lúcia, era “uma Senhora vestida toda de branco, mais brilhante que o sol, espargindo luz mais clara e intensa que um copo de cristal cheio de água cristalina, atravessado pelos raios do sol mais ardente”. Seu semblante era de uma inenarrável beleza, nem triste, nem alegre, mas sério, talvez com uma suave expressão de ligeira censura. Como descrever em pormenores seus traços? De que cor os olhos, os cabelos dessa figura celestial? Lúcia nunca o soube dizer ao certo!

O vestido, mais alvo que a própria neve, parecia tecido de luz. Tinha as mangas relativamente estreitas e era fechado no pescoço, descendo até os pés, os quais, envolvidos por uma tênue nuvem, mal eram vistos roçando as franças da azinheira. Um manto lhe cobria a cabeça, também branco e orlado de ouro, do mesmo comprimento que o vestido, envolvendo-lhe quase todo o corpo. “As mãos, trazia-as juntas em oração, apoiadas no peito, e da direita pendia um lindo rosário de contas brilhantes como pérolas, terminando por uma cruzinha de vivíssima luz prateada. [Como] único adereço, um fino colar de ouro-luz, pendente sobre o peito, e rematado, quase à cintura, por uma pequena esfera do mesmo metal”

A História de Fátima: Uma Senhora mais brilhante que o sol -Arautos do Evangelho

Nesta primeira aparição, Nossa Senhora pede aos 3 pastorinhos que venham seis meses seguidos, no dia 13, à mesma hora. E diz que ainda viria uma sétima vez.

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“Quereis oferecer-vos a Deus para suportar todos os sofrimentos que Ele quiser enviar-vos, em ato de reparação pelos pecados com que Ele é ofendido, e de suplica pela conversão dos pecadores?

À resposta afirmativa das crianças, Ela acrescentou: “Ides, pois, ter muito que sofrer, mas a graça de Deus será o vosso conforto”.

Foi ao pronunciar estas últimas palavras (‘a graça de Deus…’, etc.), que abriu pela primeira vez as mãos, comunicando-nos uma luz tão intensa, como que reflexo que delas expedia, que nos penetrava no peito e no mais íntimo da alma, fazendo-nos ver a nós mesmos em Deus, que era essa luz, mais claramente do que nos vemos no melhor dos espelhos. Então, por um impulso ín¬timo, também comunicado, caímos de joelhos e repetíamos intimamente: ‘Ó Santíssima Trindade, eu Vos adoro. Meu Deus, meu Deus, eu Vos amo no Santíssimo Sacramento’.

Passados os primeiros momentos, Nossa Senhora acrescentou: ‘Rezem o Terço todos os dias para alcançarem a paz para o mundo e o fim da guerra’.

E Nossa Senhora se elevou serenamente, subindo em direção ao nascente, até desaparecer no Céu.

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As aparições de Nossa Senhora de Fátima

A celeste Mensageira havia produzido nas crianças uma deliciosa impressão de paz e de alegria radiante, de leveza e liberdade. Parecia-lhes que poderiam voar como os pássaros. De tempos em tempos, o silêncio em que tinham caído era cortado por esta jubilosa exclamação de Jacinta:

– Ai! que Senhora tão bonita! Ai! que Senhora tão bonita!

Nas aparições, a Virgem Santíssima falou apenas com Lúcia, Jacinta só ouvia o que Ela dizia e Francisco não A ouvia mas apenas via.

A segunda aparição: 13 de junho

Já com a presença de 50 pessoas na Cova da Iria, os 3 pastorinhos viram de novo o reflexo da luz (a que chamavam relâmpago) que se aproximou da carrasqueira. Nossa Senhora queria que voltassem no próximo dia 13, que rezassem o Terço todos os dias e aprendessem a ler.

Lúcia pede para que Ela os leve para o Céu. “Sim, à Jacinta e ao Francisco levo-os em breve. Mas tu ficas cá mais algum tempo. Jesus quer servir-se de ti para Me fazer conhecer e amar. Ele quer estabelecer no mundo a devoção ao meu Imaculado Coração. A quem a abraçar, prometo a salvação; e serão queridas de Deus estas almas, como flores postas por Mim a adornar o seu trono”.

A Virgem anima Lúcia, dizendo que nunca a deixará. “O meu Imaculado Coração será o teu refúgio e o caminho que te conduzirá até Deus.”

De novo, abriu as mãos e lhes comunicou o reflexo de intensa luz, como que submergindo-os em Deus. E na palma da mão direita de Maria estava um Coração cercado de espinhos que pareciam estar nele cravados. Era o Imaculado Coração de Maria ultrajado pelos pecados da humanidade, querendo reparação! Aos poucos essa visão se esvaeceu diante das vistas enlevadas dos três pastorinhos.

E Nossa Senhora, resplandescente de luz, subiu suavemente para o leste, até desaparecer.

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As santas crianças de Nossa Senhora de Fátima

Terceira aparição: 13 de julho

Lúcia, até a tarde do dia anterior, estava resolvida a não comparecer à Cova da Iria. Mas, ao se aproximar a hora, numa sexta-feira, sentiu-se impelida por uma força estranha, à qual não lhe era fácil resistir. Foi ter com os primos, aos quais encontrou no quarto, de joelhos, chorando e rezando pois não queriam ir sem Lúcia. As três crianças, então, se puseram a caminho.

Chegando ao local da aparições, surpreenderam-se com mais de 2 mil pessoas aguardando o extraordinário acontecimento. O pai de Francisco e Jacinta, Sr. Marto, narrou ter visto uma nuvenzinha acinzentada pairar sobre a azinheira, enquanto o sol se turvava e fresca aragem soprava…

“Quero que venham aqui no dia 13 do mês que vem; que continuem a rezar o Terço todos os dias em honra de Nossa Senhora do Rosário, para obter a paz do mundo e o fim da guerra, porque só Ela lhes poderá valer”.

E Lúcia revela que Nossa Senhora pediu para eles se sacrificarem pelos pecadores e dizerem muitas vezes, em especial sempre que fizerem algum sacrifício:

“Ó Jesus, é por Vosso amor, pela conversão dos pecadores, e em reparação pelos pecados cometidos contra o Imaculado Coração de Maria”.

Maria Santíssima revela, então, aos 3 pastorinhos a primeira parte do segredo de Fátima: a visão do inferno; a segunda parte do segredo: o anúncio do Castigo e dos meios para evitá-lo. A terceira parte do segredo permaneceu desconhecida até 26 de junho de 2000. Nesta data, foi ela divulgada por determinação de S.S. o Papa João Paulo II.

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Nossa Senhora, então, elevou-se em direção ao nascente, até desaparecer no firmamento. O final da aparição, segundo Sr. Marto, foi indicado por uma espécie de trovão.

Nossa Senhora de Fátima - Dogmas marianos - Maria nunquam satis - Revista Arautos do Evangelho - Revista Católica - Aparições em Fátima - 13 de maio - A Treze de Maio

Quarta aparição: 15 de agosto

Às vésperas da data, os 3 pastorinhos foram seqüestrados e mantidos por 3 dias sob vigilância pelo Administrador de Ourém, que lhes desejava arrancar os segredos a eles confiados. Assim, não puderam comparecer à Cova da Iria, no dia 13 de agosto. Alguns dos presentes, no local, testemunharam ter ocorrido o trovão, o relâmpago e o surgimento da pequena nuvem, leve, branca e bonita, pairando sobre a azinheira. E que, depois, subiu e desapareceu no céu.

Libertos e estando, em 15 de agosto, a pastorear em Valinhos, Lúcia e Jacinto sentiram algo sobrenatural que os envolvia… E mandaram que João, irmão de Jacinta, fosse chamá-la. Lúcia e Francisco viram o reflexo da luz como um relâmpago e, chegada a Jacinta, logo, Nossa Senhora apareceu sobre a carrasqueira. Ela queria que viessem no próximo dia 13 e que rezassem o Terço todos os dias.

“No último mês farei o milagre para que todos acreditem.” prometeu a Virgem.

Mandou que fossem feitos dois andores para a festa de Nossa Senhora do Rosário com o dinheiro deixado pelo povo na Cova da Iria. O restante seria usado para ajudar na capela que mandariam fazer. E, tomando um aspecto mais triste, acrescentou:

“Rezai, rezai muito e fazei sacrifícios pelos pecadores, que vão muitas almas para o Inferno por não haver quem se sacrifique e peça por elas”. – E Nossa Senhora se retira em direção ao nascente, como das outras vezes. Durante longos minutos os pastorinhos permaneceram em estado de êxtase. Sentiam-se invadidos por uma alegria inigualável, após tantos sofrimentos e temores.

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Os Pastorinhos  e a visão do inferno - Arautos do Evangelho

Quinta aparição: 13 de setembro

Nesse dia, 15 a 20 mil pessoas, e talvez mais, acorreram à Cova da Iria. Todos queriam ver, falar e fazer pedidos às crianças para que apresentassem à Virgem. Junto à carrasqueira, começaram a rezar o Terço com o povo, até que num reflexo de luz Nossa Senhora apareceu sobre a azinheira.

“Continuem a rezar o Terço para alcançarem o fim da guerra. Em outubro virá também Nosso Senhor, Nossa Senhora das Dores e do Carmo, São José com o Menino Jesus, para abençoarem o mundo. Deus está contente com os vossos sacrifícios, mas não quer que durmais com a corda [cilício], trazei-a só durante o dia”.

Segundo o testemunho de alguns espectadores, por ocasião dessa visita de Nossa Senhora, como das outras vezes, ocorreram diversos fenômenos atmosféricos. Observaram “à distância aparente de um metro do sol, um globo luminoso, que em breve começou a descer em direção ao poente e, da linha do horizonte, voltou a subir de novo em direção ao sol”. Além disso, a atmosfera tomou uma cor amarelada, verificando-se uma diminuição da luz solar, tão grande que permitia ver a lua e as estrelas; uma nuvenzinha branca, visível até o extremo da Cova, envolvia a azinheira e com ela os videntes. Do céu choviam como que pétalas de rosas ou flocos de neve, que se desfaziam pouco acima das cabeças dos peregrinos, sem deixar-se tocar ou colher por ninguém”.

Ainda que breve, a aparição de Nossa Senhora deixou os pequenos videntes felicíssimos, consolados e fortalecidos em sua fé. Francisco, de modo especial, sentia-se transportado de alegria com a perspectiva de ver, dali a um mês, Nosso Senhor Jesus Cristo, conforme lhes prometera a Rainha do Céu e da Terra.

O Terceiro Segredo de Fátima

Sexta e última aparição: 13 de outubro de 1917

Já era o outono. Uma chuva persistente e forte transformara a Cova da Iria num lamaçal e encharcava a multidão de 50 a 70 mil peregrinos, vindos de todos os cantos de Portugal. Assim que chegaram os videntes, Lúcia pediu que fechassem os guarda-chuvas para rezarem o Terço. E, pouco depois, houve o reflexo de luz e Nossa Senhora apareceu sobre a carrasqueira.

“Quero dizer-te que façam aqui uma capela em minha honra, que sou a Senhora do Rosário, que continuem sempre a rezar o Terço todos os dias. A guerra vai acabar e os militares voltarão em breve para suas casas.”

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Ao pedido de cura para uns doentes e conversão para alguns pecadores, Nossa Senhora respondeu:

“Uns sim, outros não. É preciso que se emendem, que peçam perdão dos seus pecados”.

E tomando um aspecto triste, Ela acrescentou:

“Não ofendam mais a Deus Nosso Senhor que já está muito ofendido”.

E, abrindo as mãos, fê-las refletir no sol, e enquanto Se elevava, continuava o reflexo da sua própria luz a projetar-se no sol.

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Visões de cenas simbolizando os Mistérios gozosos, dolorosos e gloriosos do Rosário

Chovera durante toda a aparição. Lúcia, no término de seu colóquio com Nossa Senhora, gritara para o povo: “Olhem para o sol!” Rasgam-se as nuvens, e o sol aparece como um imenso disco de prata. Apesar de seu intenso brilho, pode ser olhado diretamente sem ferir a vista. As pessoas o contemplam absortas quando, de súbito, o astro se põe a “bailar”. Gira rapidamente como uma gigantesca roda de fogo. Pára de repente, para dentro em pouco recomeçar o giro sobre si mesmo numa espantosa velocidade. Finalmente, num turbilhão vertiginoso, seus bordos adquirem uma cor escarlate, espargindo chamas vermelhas em todas as direções. Esses fachos refletem-se no solo, nas árvores, nos arbustos, nas faces voltadas para o céu, reluzindo com todas as cores do arco-íris. O disco de fogo rodopia loucamente três vezes, com cores cada vez mais intensas, treme espantosamente e, descrevendo um ziguezague descomunal, precipita-se em direção à multidão aterrorizada. Um único e imenso grito escapa de todas as bocas. Todos caem de joelhos na lama e pensam que vão ser consumidos pelo fogo. Muitos rezam em voz alta o ato de contrição. Pouco a pouco, o sol começa a se elevar traçando o mesmo ziguezague, até o ponto do horizonte de onde havia descido. Torna-se então impossível fitá-lo. É novamente o sol normal de todos os dias. O ciclo das visões de Fátima estava encerrado.

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Os prodígios haviam durado cerca de 10 minutos. Todos se entreolhavam perturbados.Depois, a alegria explodiu: “O milagre! As crianças tinham razão!” Os gritos de entusiasmo ecoavam pelas colinas adjacentes, e muitos notavam que sua roupa, encharcada alguns minutos antes, estava completamente seca.

O milagre do sol pôde ser observado a uma distância de até 40 quilômetros do local das aparições.

A promessa da sétima vinda de Nossa Senhora

Em sua primeira aparição, a Santíssima Virgem pediu aos 3 pastorinhos que viessem à Cova da Iria seis meses seguidos. E acrescentou: “Depois voltarei ainda aqui uma sétima vez”.

Seguiram-se as seis aparições, segundo o relato da Irmã Lúcia, pairando o mistério sobre a sétima aparição…

Estará, esta, ligada à promessa do triunfo de Seu Imaculado Coração? Esse triunfo, sem dúvida, configura uma suprema e altíssima esperança para os dias de hoje! Fátima, queiramos ou não, tornou-se com a promessa “Por fim meu Imaculado Coração triunfará” o ponto de referência essencial, indispensável, para nossa vida e para o mundo contemporâneo.

Fátima, inegavelmente, é a aurora do terceiro milênio!


 

 

“Maria não foi ainda suficientemente louvada e exaltada, honrada, amada e servida. Ela merece muito maior louvor, respeito, amor e serviço”.

De Maria nunquam satis

De Maria nunquam satis… Repetida por São Bernardo de Claraval e outros Santos, este categórico louvor à Mãe de Deus é habitualmente traduzido como: “A respeito de Maria jamais se dirá o bastante”.

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Mas tal afirmação faz recordar também que a nenhum fiel é lícito não ter devoção a Nossa Senhora, pois “a Mãe de Deus é o modelo e a figura da Igreja, na ordem da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo”. 1

Quão poucas vezes nos detemos, infelizmente, para pensar na extraordinária grandeza que se oculta por trás de um doce e humilde rosto de Mãe! Cientes dessa nossa falha, paremos um pouco, caro leitor, para refletir sobre Ela, tendo bem presente a bela imagem que ilustra nossa capa neste mês dedicado a Maria.

O Corpo de Cristo foi-Lhe dado por Maria

São Luís Maria Grignion de Montfort une sua voz à de outros Santos — entre eles Santo Agostinho, São Cirilo de Jerusalém, São Bernardo, São Bernardino, São Tomás e São Boaventura — para afirmar sem rodeios que, por vontade de Deus, a devoção a Maria é necessária à salvação. Em razão disto, acrescenta, “não se deve confundir a devoção à Santíssima Virgem com a devoção aos outros Santos, como se Ela não fosse muito mais necessária, e fosse apenas de super-rogação, isto é, um acréscimo”. 2

Maria Santíssima é verdadeira Mãe de Deus e nossa. Por Maria, somos irmãos em Cristo, no Espírito Santo. Ela é o elo sagrado entre a criatura e o Criador.

Maria está tão ligada a Deus no Mistério da Salvação, que jamais ­Jesus poderia ter dito, na instituição da Eucaristia: “Isto é o meu Corpo […] Este cálice é a Nova Aliança no meu Sangue” (I Cor 11, 24-25), nem soprado sobre os discípulos, conferindo-lhes o poder de perdoar pecados (cf. Jo 20, 22-23), se não tivesse assumido um corpo humano no seio da Virgem Maria. Com efeito, Cristo, ao entrar no mundo disse: “Formaste-Me um corpo” (Hb 10, 5). Esse corpo foi-Lhe dado pela humilde Virgem de Nazaré.

Medianeira de todas as graças

Ensina-nos a Igreja que Maria, apesar da dignidade de ser a mais sublime criatura saída das mãos do Criador, está infinitamente abaixo de Deus. Contudo, o mesmo Deus, sem necessitar de nada ou de ninguém, quis servir-Se d’Ela. E, sendo esta a vontade divina, ninguém pode duvidar de que é imutável e a mais perfeita.

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São Luís Grignion afirma: “Foi por meio da Santíssima Virgem Maria que Jesus Cristo veio ao mundo, e é também por meio d’Ela que Ele há de reinar no mundo”. 3 Aquele que disse ser “o Caminho” (Jo 14, 6) escolheu vir ao mundo por meio de Maria. Poderiam os homens escolher outra via para ir a Ele?

A Virgem Mãe é a Medianeira de todas as graças, com uma distinção importante: Jesus é o Mediador de Redenção, “porque há um só Deus e há um só mediador entre Deus e os homens: Jesus Cristo, Homem” (I Tm 2, 5). Maria é a Medianeira de intercessão. Ela está entre Deus, de quem é Mãe, e os homens, aos quais assumiu como filhos, quando Jesus Lhe entregou João, o discípulo amado, dizendo: “Eis aí o teu filho” (Jo 19, 26).

Os mil títulos de Maria Santíssima

Por ser Maria, assim, Mãe de todos os verdadeiros filhos de Deus, estes não economizam títulos para fazer sentir quanto Ela está ao alcance de mãos que se juntam e de joelhos que se dobram confiantes.

Ela é conhecida pelo nome dos lugares nos quais apareceu: Senhora de Fátima, de Lourdes, ou de La Salette. Torna-Se, por assim dizer, uma habitante daquele lugar.

Ao seu nome se acrescentam as virtudes das quais é modelo, e que devemos praticar. Por isso A invocamos como Mãe Castíssima, Mãe Puríssima, Virgem Prudentíssima, Virgem Fiel…

Ao seu santo nome acrescentamos as nossas necessidades, denominando-A Consoladora dos Aflitos, Senhora das Mercês ou Senhora do Amparo… e nada se compara ao auxílio de Nossa Senhora.

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Tão próxima dos homens e mulheres, que ousamos juntar a esse santíssimo nome até a feiura de nossas misérias: Refúgio dos Pecadores, Porto Seguro dos Náufragos, Saúde dos Enfermos, Senhora do Bom Remédio, remédio de nossas feridas…

Mãe bondosa que roga por filhos pecadores

Nossa Senhora de Fátima - Dogmas marianos - Maria nunquam satis - Revista Arautos do Evangelho - Revista Católica

Entre os mil títulos da única e mesma Maria, aquele que se encontra nos lábios de todos os cristãos, e com mais frequência é recordado, é sem dúvida o de “mãe”. Todos os dias, sem nos darmos conta, ao rezarmos a Ave-Maria, lembramos esta verdade doce e consoladora.

No Pai-nosso, chamamos a Deus de Pai e pedimos o Reino, o pão e o perdão. Na Ave-Maria, nada pedimos, a não ser: “rogai por nós pecadores”, sem indicar nenhum outro desejo. É a oração de quem pede sem pedir, pois, sendo Ela Mãe, conhece as nossas necessidades e sabe, melhor do que nós mesmos, aquilo que nos convém. Por quê? Simplesmente por ser Mãe!

A certeza da bondade de ­Nossa Senhora para com os homens e do seu poder de intercessão junto ao seu Divino Filho, nós a haurimos nos próprios Evangelhos. Nas Bodas de Caná, foi a Virgem quem percebeu que o vinho veio a faltar e, sem ninguém Lhe pedir, tomou a iniciativa de recorrer a Ele.

“Minha hora ainda não chegou” (Jo 2, 4), argumentou Jesus. Mas as mães não costumam marcar hora para socorrer os filhos, por isso Ela disse aos serventes: “Façam tudo quanto Ele vos disser” (Jo 2, 5). Ao mesmo tempo em que apressava o milagre, a Mãe de Deus e nossa nos dava um precioso conselho, como quem diz: “simplesmente faça”, sem ­indicar quando nem como. Com efeito, precisamos confiar em Jesus quando nos manda fazer algo, em qualquer tempo ou lugar, pois Ele tem poder para mudar água em vinho, doença em saúde ou, se for de sua vontade, fraqueza em força para enfrentar o sofrimento.

A respeito do poder de intercessão de Maria junto ao seu Filho, o então Cardeal Ratzinger cita um comovedor comentário, no qual coloca o próprio Deus como um “devedor” da Virgem Mãe. Esta tudo pode, pois seu Filho “não deixa de satisfazer nenhum de seus desejos, porque nunca Lhe restituiu o que d’Ela tomou emprestado”. 4 Isso nos faz sentir à vontade e confiantes junto à Mãe de Deus, pois Ela é tão misericordiosa quanto poderosa.

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Maria tem pressa em nos ajudar

Ademais, Maria Santíssima tem pressa em socorrer seus filhos necessitados, mesmo se estes nada Lhe pedem: não subiu Ela apressada a montanha para ir ajudar sua prima Isabel, logo depois de receber o anúncio do Anjo? (cf. Lc 1, 39). Não podemos, pois, duvidar! Também no Céu Maria tem pressa, pressa de nos ajudar.

Conforme nos ensina São Luís Grignion, a conduta das três Pessoas da Santíssima Trindade é imutável e, portanto, Deus quer servir-Se de Maria na santificação das almas até a consumação dos séculos. 5

Por isso, sempre será verdadeiro que “de Maria nunquam satis”. Isto é, “Maria não foi ainda suficientemente louvada e exaltada, honrada, amada e servida. Ela merece muito maior louvor, respeito, amor e serviço”. 6


Verdades de Fé proclamadas pelo Magistério em sua missão de custodiar e expor a Revelação, os dogmas marianos constituem um autêntico sinal da divina vitalidade da Igreja.

Os dogmas marianos: luz para a Igreja

Após a Ascensão do Senhor aos Céus, coube aos Apóstolos, já transformados pelas graças de Pentecostes, a missão de instruir os homens na Boa Nova. Assim o fez Filipe, por exemplo, quando, impelido pelo Espírito, se aproximou do estrangeiro que lia um trecho de Isaías e lhe perguntou: “Tu compreendes o que estás lendo” ? Ao que este respondeu: “Como posso se não há quem mo explique?” (At 8, 31). Então Filipe, “principiando por essa passagem da Escritura, anunciou-lhe Jesus” (At 8, 35).

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Com efeito, sendo a Palavra de Deus expressa com as limitações próprias à linguagem humana, e estando as nossas mentes sempre sujeitas a enganos, era inevitável surgirem dúvidas e dificuldades na compreensão do sagrado depósito da Fé, dando origem às mais variadas interpretações. Inclusive porque na Sagrada Escritura, conforme escreve São Pedro a propósito das cartas paulinas, “há algumas partes difíceis de entender, cujo sentido os espíritos ignorantes ou pouco fortalecidos deturpam, para sua própria ruína” (II Pd 3, 16).
Jesus, portanto, quis instituir um Magistério vivo, confiado ao Papa e aos bispos, sucessores dos Apóstolos, a fim de que “permanecesse íntegro e fosse transmitido a todas as gerações tudo quanto tinha revelado para salvação de todos os povos” 1b, possibilitando-lhe praticar a Fé autêntica sem erro. 2b

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A este Magistério vivo, e somente a ele, cabe “o encargo de interpretar autenticamente a palavra de Deus escrita ou contida na Tradição”; 3b e seu caráter infalível se verifica ao definir, por singular assistência do Espírito Santo, doutrinas em matéria de Fé e moral, seja através do Papa, pronunciando-se ex cathedra, ou do Colégio Episcopal “quando este exerce o supremo Magistério em união com o sucessor de Pedro”. 4b

É nesse contexto que se inserem as definições dogmáticas nas quais “o Magistério da Igreja empenha plenamente a autoridade que recebeu de Cristo” 5b e propõe ao povo cristão uma verdade a ser aceita com adesão irrevogável de Fé. Longe de serem imposições arbitrárias, “os dogmas são luzes no caminho de nossa Fé que o iluminam e tornam seguro”. 6b

Os sucessores dos Apóstolos não são apenas mestres, mas também pastores; seus ensinamentos visam, pois, intervir na ordem concreta dos fatos. Por isso, “insistem mais num ponto ou noutro, desenvolvem mais uma matéria, enriquecem de preferência outra, com novos ensinamentos e novas leis, tudo ao influxo do que lhe vai pedindo a solicitude pastoral à vista das diversas vicissitudes pelas quais vai passando o gênero humano ao longo da História”. 7b

Nesse sentido, ensina Santo Agostinho: “Referentes à Fé católica, há muitos pontos que, ao serem postos no tapete da discussão pela astuta inquietude dos hereges, para podermos fazer-lhes frente, devem ser considerados com mais cuidado, entendidos com mais clareza e pregados com mais insistência. E, assim, a questão suscitada pelo adversário oferece oportunidade para aprender”. 8b

Há, entretanto, um motor ainda mais dinâmico do que as heresias no desenvolvimento da Fé: é o amor do povo fiel que, inspirado pelo Espírito Santo, impulsiona os seus Pastores a tornarem explícitos certos aspectos da Revelação. Assim, as novas definições dogmáticas não nascem de frias considerações doutrinais, mas provêm das legítimas necessidades e apetências do povo de Deus.

As proclamações dos dogmas marianos são belos testemunhos dessa imbricação entre o Magistério vivo e o fervor dos fiéis, desde os primeiros séculos do Cristianismo. O surgimento das primeiras heresias e o surto de amor à verdade que se insurgiu contra elas vai dar uma oportunidade única ao desenvolvimento da Doutrina Cristã, fomentando a reflexão teológica e propiciando as intervenções do Magistério da Igreja, vigilante salvaguarda da Fé.

A história da definição da maternidade divina e da virgindade perpétua de Maria Santíssima como verdades de Fé são dois magníficos exemplos desta realidade.

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Maternidade divina

Entre as inúmeras lições outorgadas aos homens pela História, há uma de capital importância: a forma mais eficaz de combater uma verdade nem sempre consiste em propagar o erro oposto, mas em exagerar algum de seus aspectos. Constata-se isso ao analisar o movimento pendular das heresias dos primeiros séculos, as quais, sob as aparências de zelo e pia defesa da ortodoxia, sucederam-se nos mais heterodoxos extremismos, igualmente distantes do equilíbrio da Fé. Foi o sucedido, por exemplo, com a heresia que ocasionou a definição do primeiro dogma mariano.

Grassava no século IV um terrível erro cristológico difundido por Apolinário, Bispo antiariano de Laodiceia, o qual, alegando a necessidade de salvaguardar a unidade de Cristo com Deus, terminou por amputar-Lhe a natureza de homem, negando a existência da alma humana no Verbo Encarnado.

Contra os apolinaristas — como ficaram conhecidos os seguidores do heresiarca —, levantou-se Nestório, Patriarca de Constantinopla, defendendo a integridade tanto da natureza humana como da divina, mas afirmando um erro oposto: ambas eram tão completas que formavam duas hipóstases independentes, duas pessoas unidas de maneira extrínseca e acidental. Assim, Cristo seria Deus e homem, não no sentido católico da união hipostática do Verbo com a humanidade, mas formando um composto de duas pessoas distintas, havendo entre elas apenas uma união moral. 9b Essa doutrina comportava um importante corolário: Maria não era Mãe da pessoa divina, mas apenas da natureza humana de Cristo. Portanto, deveria ser chamada Khristotókos (Mãe de Cristo), e não Theotókos (Mãe de Deus).

Tal afirmação contundia tanto o ensinamento dos Padres, quanto a piedade dos fiéis, cuja indignação diante das proposições de Nestório não foi pequena.

Com efeito, claros precedentes da doutrina estabelecida pelo dogma aparecem desde os primeiros tempos da literatura cristã. Já nos escritos de Santo Inácio de Antioquia, que foi discípulo do Apóstolo João, encontramos expressões como estas: “De fato, o Nosso Deus Jesus Cristo, segundo a economia de Deus, foi levado no seio de Maria, da descendência de Davi e do Espírito Santo” 10b; “Constatei que sois perfeitos na Fé imutável. […] Estais plenamente convencidos de que Nosso Senhor é verdadeiramente da descendência de Davi segundo a carne, Filho de Deus segundo a vontade e o poder de Deus, nascido verdadeiramente da Virgem”. 11b

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Em sentido análogo se pronuncia Santo Irineu, no segundo século, quando atribui à mesma Pessoa a geração eterna e a temporal, acentuando a unidade pessoal de Cristo, Verbo de Deus e Filho de Maria: “É, portanto, o Filho de Deus nosso Senhor, Verbo do Pai e, ao mesmo tempo, Filho do homem, que de Maria, nascida de criaturas humanas e Ela própria criatura humana, teve nascimento humano, tornando-Se Filho do homem”. 12b
A devoção dos fiéis pela “Sancta Dei Genitrix (Santa Mãe de Deus)” vem demonstrada, pelo menos desde o século III, pela prece Sub tuum præsidium, a mais antiga oração dirigida a Maria da qual se tem conhecimento, no qual Ela é assim invocada. 13b Segundo afirma Gabriel Roschini, “no século IV, mesmo antes do Concílio de Éfeso, a expressão Mãe de Deus se tornara tão comum entre os fiéis que dava nos nervos do Imperador Juliano, o Apóstata”. 14b

Empolgantes são as páginas deste capítulo da História da Igreja em que, tendo à frente o grande São Cirilo de Alexandria, o Concílio de Éfeso definiu no ano 431 a verdade destinada a brilhar para sempre no firmamento da teologia: “Se alguém não confessar que o Emanuel é Deus no sentido verdadeiro e que, portanto, a santa Virgem é deípara (pois gerou segundo a carne o Verbo que é Deus e veio a ser carne), seja anátema”. 15b

É digno de nota o entrelaçamento havido entre a fé popular e a reação doutrinária contra a heresia, como fator decisivo para a proclamação deste primeiro dogma mariano. A par das questões teológicas, faz-se presente em quase todas as obras que tratam sobre o Concílio de Éfeso, a constituição de uma como que “torcida” dos fiéis pela proclamação do dogma, manifestada, sobretudo, na narrativa do júbilo popular após o encerramento da sessão que consagrou a Theotókos: provida de tochas acesas, a multidão devota acompanhou os Padres conciliares até suas moradas, aclamando-os pelas ruas da cidade.

Estavam abertas, assim, as portas para as definições formais da Santa Igreja sobre as realidades teológicas que dizem respeito à Santíssima Virgem. A segunda delas, sobre a sua virgindade perpétua, viria duzentos anos mais tarde, novamente em defesa da verdade na luta contra a falsa doutrina.

Nossa Senhora de Fátima - Dogmas marianos - Maria nunquam satis - Revista Arautos do Evangelho - Revista Católica

Virgindade perpétua

A virgindade perpétua da Mãe de Deus é sintetizada nesta fórmula: Maria foi virgem antes do parto, no parto e depois do parto. Estes três elementos do dogma afirmam a concepção virginal de Jesus, pois Maria foi mãe por virtude divina, sem concurso humano; o nascimento milagroso de Jesus, “o qual não só não lesou a integridade de sua Mãe, mas também a consagrou” 16b; e a integridade de Maria Santíssima depois do nascimento de seu Divino Filho.

Já os livros do Antigo Testamento trazem imagens e profecias sobre a virgindade de Maria como comenta São Bernardo: “Que prefigurava em seu dia aquela sarça ardendo sem consumir-se? A Maria dando a luz sem dor alguma. E a vara de Aarão, que floresce misteriosamente, sem havê-la plantado? À Virgem, que concebeu sem concurso de varão. E será Isaías quem melhor nos formule o maior mistério deste prodigioso milagre. ‘Germinará uma vara do tronco de Jessé, e de sua raiz brotará uma flor’, assim deixa representada a Virgem na vara, e seu parto na flor”. 17b

E prototípica é a profecia de Isaías, recolhida por São Mateus: “Tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que o Senhor falou pelo profeta: ‘Eis que a Virgem conceberá e dará à luz um filho que se chamará Emanuel’ (Is 7, 14), que significa: ‘Deus conosco’” (Mt 1, 22-23).

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No Novo Testamento, a concepção virginal é atestada por São Lucas e São Mateus, ao afirmarem que Jesus foi gerado pelo Espírito Santo: “O Espírito Santo descerá sobre Ti, e a força do Altíssimo Te envolverá com a sua sombra. Por isso o ente santo que nascer de Ti será chamado Filho de Deus” (Lc 1, 35); “José, filho de Davi, não temas receber Maria por esposa, pois o que n’Ela foi concebido vem do Espírito Santo” (Mt 1, 20).
Apesar desses indícios escriturísticos, a maternidade virginal de Maria foi alvo dos ataques de várias heresias nos primeiros séculos, como a corrente dos ebionitas, a qual negava a divindade de Jesus. Contudo, a concepção virginal era já considerada pela Igreja como indiscutível patrimônio doutrinário 18b, e foi posta a serviço da defesa da divindade do Redentor. É neste período que, com São Justino, a expressão “a Virgem” começa a se tornar característica para designar Maria Santíssima. 19b

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No século IV, houve uma ampla explicitação deste dogma, como reação aos erros então propagados. Defenderam a virgindade perpétua de Maria grandes escritores como Santo Epifânio, São Jerônimo, Santo Ambrósio e Santo Agostinho. Belas são as páginas dedicadas pelo Bispo de Hipona ao louvor deste privilégio mariano, como nos mostra o seguinte trecho: “Maria permanece virgem ao conceber seu Filho, virgem como gestante, virgem ao dá-Lo à luz, virgem ao alimentá-Lo em seu seio, sempre virgem. Por que te admiras disso, ó homem? Uma vez que Deus Se dignou fazer-Se homem, convinha que nascesse desse modo”. 20b

Não tardou que ao aprofundamento teológico se acrescentasse o reconhecimento do Magistério. Coube ao Sínodo de Latrão de 649, convocado pelo Papa São Martinho I, a proclamação do dogma.

Após as grandes controvérsias cristológicas de seus primórdios, a Igreja esperaria doze séculos para uma nova definição dogmática solene sobre os atributos da Mãe de Deus. Desta vez, não será ela impelida pela necessidade de combater heresias, mas por outro possante fator de desenvolvimento dogmático: o sensus fidei.

O dogma da Imaculada Conceição: triunfo da piedade cristã

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A definição do dogma da Imaculada Conceição é um exemplo paradigmático da Fé eclesial que, por especial assistência do Espírito Santo, cresce e se aprofunda na compreensão das verdades reveladas. Neste caso, o povo cristão, “que não sabe teologia, mas tem o ‘instinto da fé’, que provém do mesmo Espírito Santo e lhe faz pressentir a verdade, ainda que não saiba demonstrá-la” 21b, antecipou-se aos doutos e sábios crendo na Imaculada Conceição de Maria.

Estimulados pela fé instintiva dos fiéis, os teólogos buscaram fundamentá-la com argumentos plausíveis e harmonizá-la com o conjunto da Revelação. E foi neste ponto que a tese da Imaculada Conceição se viu incompreendida até por grandes e piedosos doutores, como São Bernardo, Santo Anselmo, São Boaventura, Santo Alberto Magno e São Tomás de Aquino, os quais não ousavam defender a proclamação deste dogma por não conseguirem conciliá-lo com a doutrina acerca da transmissão do pecado original e da redenção universal operada por Cristo.

Uma reação à altura em favor do dogma apareceria anos mais tarde, com o Beato João Duns Escoto, o qual “depois de bem fixar os verdadeiros termos da questão, estabeleceu com admirável clareza os sólidos fundamentos para desvanecer as dificuldades que os contrários opunham à singular prerrogativa mariana”. 22b Tais fundamentos consistiram, sobretudo, na elaboração do conceito de redenção preventiva, argumento decisivo da doutrina sobre a Imaculada.

Argumentam os teólogos que há duas formas de libertar um cativo: pagando o preço de seu resgate para tirá-lo do cativeiro em que já está (situação análoga à redenção liberativa, na qual, pelos méritos de Cristo, somos limpos da culpa original herdada de nossos primeiros pais); ou pagando antecipadamente, impedindo a pessoa de cair em cativeiro (redenção preventiva). Esta última é uma verdadeira e própria redenção, mais autêntica e profunda que a primeira, e é a que se aplicou à Santíssima Virgem, preservada imune de qualquer mancha de pecado, desde o primeiro instante de sua concepção. 23b

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O entusiasmo do bom povo de Deus do mundo inteiro — e especialmente da Espanha — fazia-se sentir até no Vaticano. Entretanto foi preciso esperar até 8 de dezembro de 1854 para a declaração do dogma. Então, como afirma Pio IX, “teria chegado o tempo oportuno para definir a Imaculada Conceição da Virgem Mãe de Deus, que a Sagrada Escritura, a veneranda tradição, a constante percepção da Igreja, o singular consenso dos Bispos católicos e dos fiéis, os atos memoráveis e as constituições dos nossos predecessores ilustram e explicam admiravelmente”. 24b

A solene definição teve lugar na Basílica Vaticana com a presença de numerosas autoridades eclesiásticas e de uma multidão de devotos. Observou uma testemunha ocular desse memorável dia: “É hoje em Roma, como outrora em Éfeso: as celebrações de Maria são, em toda a parte, populares. Os romanos se aprestam a receber a definição da Imaculada Conceição, como os efésios acolheram a da Maternidade Divina de Maria: com cânticos de júbilo e manifestações do mais vivo entusiasmo”. 25b Estava consagrada para sempre a fórmula encontrada pelos fiéis espanhóis, que tão grande papel tiveram na difusão desta verdade, para expressar seu amor pela Imaculada: “Ave Maria Puríssima, sem pecado concebida!”.

Maria assunta ao Céu

A proclamação dogma da Assunção, definido por Pio XII quase um século depois, é outro belo exemplo de maturação da Fé eclesial.

A devoção popular pela Assunção de Maria em corpo e alma aos Céus encontrou suas primeiras manifestações numa antiquíssima celebração litúrgica no Oriente. Prévias a essa celebração são as primeiras referências da Tradição sobre o destino final da Santíssima Virgem, que aparecem entre os séculos IV e V, destacando-se as asserções de Santo Efrém e Santo Epifânio. Os testemunhos dos Padres tornaram-se mais numerosos a partir do século seguinte, e de grande importância são as homilias de Santo André de Creta e, sobretudo, de São João Damasceno que “entre todos se distingue como pregoeiro desta tradição”. 26b

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Seguindo os Padres da Igreja, os teólogos escolásticos expuseram com grande clareza o significado da Assunção e sua profunda conexão com as demais verdades reveladas, muito contribuindo na progressiva divulgação deste privilégio da Mãe de Deus. Pode-se dizer que, em linhas gerais, a partir do século XV os teólogos já eram unânimes em afirmá-lo. A esses testemunhos litúrgicos, patrísticos e teológicos cabe acrescentar numerosas expressões da piedade popular, entre elas a dedicação de um dos mistérios do Rosário a essa verdade.

Tal consenso eclesial é apontado por Pio XII como argumento fundamental para a proclamação dogmática da Assunção, pois mostra “a doutrina concorde do Magistério ordinário da Igreja, e a Fé igualmente concorde do povo cristão — que aquele Magistério sustenta e dirige — e, por isso mesmo, manifesta, de modo certo e imune de erro, que tal privilégio é verdade revelada por Deus e contida no depósito divino que Jesus Cristo confiou a sua esposa para o guardar fielmente e infalivelmente o declarar”. 27b Apoiada nesses pressupostos, a definição solene realizou-se em 1950.

O ambiente que emoldurou a declaração dogmática da Assunção foi, sem dúvida, impressionante, como puderam registrar as câmeras fotográficas da época. Numerosos Cardeais, Bispos, sacerdotes e religiosos, além da grande multidão de fiéis, acorreram à Praça de São Pedro, sem contar todos os que, espalhados pelo mundo, acompanharam a transmissão por rádio e televisão. Era o orbe católico unido em “um só coração e uma só alma” (At 4, 32), assistindo à solene proclamação da Fé que em uníssono professava.

Assim rezam as palavras definitórias: “Para glória de Deus onipotente que à virgem Maria concedeu a sua especial benevolência, para honra do seu Filho, Rei imortal dos séculos e triunfador do pecado e da morte, para aumento da glória da sua augusta Mãe, e para gozo e júbilo de toda a Igreja, com a autoridade de Nosso Senhor Jesus Cristo, dos bem-aventurados Apóstolos São Pedro e São Paulo e com a nossa, pronunciamos, declaramos e definimos ser dogma divinamente revelado que: a Imaculada Mãe de Deus, a sempre Virgem Maria, terminado o curso da vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celestial”. 28b

Sinal de crescimento e fortalecimento

Nas poucas narrações da infância de Jesus registradas nos Evangelhos, figura uma admirável — mas, hélas, quão sucinta! — síntese dos primeiros anos do Verbo de Deus feito carne: “O Menino ia crescendo e Se fortificava: estava cheio de sabedoria, e a graça de Deus repousava n’Ele” (Lc 2, 40). Tais palavras relativas a Cristo bem podem ser aplicadas a seu Corpo Místico, o qual cresce e se fortalece continuamente, animado pelo Espírito Santo que o vivifica.
Ora, ao término desta reflexão, é reconfortante observar o quanto as definições dogmáticas constituem uma das mais belas manifestações desse crescimento. Pois, como ensina o padre Garrigou-Lagrange, a solene declaração das verdades de Fé e sua penetração cada vez mais profunda no povo cristão apresentam como principal corolário o conduzir à compreensão — tanto quanto seja possível nesta Terra — d’Aquele que “nos ama além do que podemos conceber e desejar, até querer associar-nos à sua vida íntima, levar-nos pouco a pouco a vê-Lo como Ele Se vê, e amá-Lo como Ele Se ama”. 29b

Portanto, se a solene declaração de uma verdade de Fé tem por principal finalidade conduzir ao conhecimento de Deus e das realidades a Ele concernentes, a mais relevante implicação teológica dos dogmas marianos não poderia ser outra senão a de proporcionar, a partir da explicitação do conteúdo da Revelação, uma maior ciência acerca d’Aquela que Deus escolheu por Mãe e uniu a Si e a toda Igreja de forma singularíssima.

Assim o entendeu a Igreja que, a partir da exegese das Escrituras, da ausculta da Tradição, do labor teológico e da fidelidade à ação do Espírito Paráclito nas almas, descortinou amplos panoramas na compreensão da Santíssima Virgem e de seu Divino Filho.

Nos primeiros séculos, a tenra Igreja recém-nascida vê-se convulsionada por diversas heresias. Grande perigo? Sem dúvida. Mas também excelente oportunidade para a consolidação doutrinária, esforço que talvez não se tivesse efetuado se não fosse a necessidade apologética.

Bem o demonstram a solene declaração da Maternidade Divina e a virgindade perpétua, dogmas que alargaram os horizontes da Doutrina Católica, conferindo a Nossa Senhora um destaque único. Estavam lançados os fundamentos da Mariologia, abertas as portas para o florescimento das festividades em honra à Mãe de Deus e estabelecidas sólidas bases para a devoção mariana dos fiéis.

Passam-se os séculos, e a robustez doutrinária já alcançada permite que se verifique outra forma de desenvolvimento da piedade, desta vez a partir do senso sobrenatural da Fé. As verdades reveladas já definidas, seus corolários doutrinários e suas manifestações litúrgicas são base para a profícua ação do Espírito Santo, que inspira nos fiéis novos aprofundamentos. Estes serão colhidos pelo Magistério da Igreja e, quais novos rebentos inseridos no rol das verdades de Fé, são proclamados os dogmas da Imaculada Conceição e da Assunção de Maria.

Organismo vivo e — ao contrário das leis naturais — em contínuo rejuvenescimento, a Igreja pode ainda ver florescer em seu regaço novos dogmas marianos, como, por exemplo, o da mediação universal e o da corredenção da Santíssima Virgem, se a isto a conduzir o cumprimento de sua missão. Sem jamais constituir entraves coercitivos e obsoletos, farão ressoar novamente o grande conselho cristocêntrico de Maria: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo 2, 5), convidando-nos a uma adesão amorosa ao Magistério da Igreja, “coluna e sustentáculo da verdade” (I Tm 3, 15).


Fonte: Arautos do Evangelho

1 CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.63.
2 SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem, n.39.
3 Idem, n.1.
4 RATZINGER, Joseph. O Caminho Pascal. Lisboa: Lucerna, 2006, p.75-76.
5 Cf. SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT, op. cit., n.22.
6 Idem, n.10.
1b CONCÍLIO VATICANO II. Dei Verbum, n.7.
2b CIC, 890.
3b CONCÍLIO VATICANO II. Dei Verbum, n.10.
4b CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.25.
5b CIC 88.
6b Idem, 89.
7b CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. A Igreja e a História. In: Dr. Plinio. São Paulo. Ano V. N.46 (Jan., 2002); p.20.
8b SANTO AGOSTINHO. A Cidade de Deus, l.XVI, c.2, 1.
9b Cf. ALASTRUEY, Gregorio. Tratado de la Virgen Santísima. Madrid: BAC, 1956, p.76-77.
10b SANTO INÁCIO DE ANTIOQUIA. Carta aos efésios, 18,2.
11b Idem, Carta aos esmirniotas, 1,1.
12b SANTO IRINEU DE LIÃO. Contra as heresias, l.3, c.19, 3.
13b ROSCHINI, Gabriel. Instruções marianas. São Paulo: Paulinas, 1960, p.44.
14b Idem, ibidem.
15b Dz 252.
16b CONCÍLIO VATICANO II. Lumen gentium, n.57.
17b SÃO BERNARDO DE CLARAVAL. Laudibus Virginis Matris, II, 5.
18b Em sua Apologia, São Justino apresenta a concepção virginal de Maria como uma verdade fundamental da religião cristã (I, 33); de igual modo, Santo Irineu (Adv. Haer. 3,19ss) afirma que esta verdade é uma das contidas na “regra de Fé” que todos devem crer.
19b Cf. ALDAMA, José Antonio de. María en la patrística de los siglos I y II. Madrid: BAC, 1970, p.83.
20b SANTO AGOSTINHO. Sermão 186,1.
21b ROYO MARÍN, OP, Antonio. La Virgen María: teología y espiritualidad marianas. 2.ed. Madrid: BAC, 1997, p.75.
22b CLÁ DIAS, EP, João Scognamiglio. Pequeno ofício da Imaculada Conceição comentado. São Paulo: Artpress, 1997, p.496.
23b Cf. ROYO MARÍN, op. cit., p.75.
24b PIO IX. Ineffabilis Deus, n.22.
25b CHANTREL, Joseph. Histoire populaire des papes, apud CLÁ DIAS, op. cit., p.501.
26b PIO XII. Munificentissimus Deus, n.21.
27b Idem, n.12.
28b Idem, n.44.
29b GARRIGOU-LAGRANGE, OP, Réginald. El sentido común: la filosofía del ser y las fórmulas dogmáticas. Buenos Aires: Desclée de Brouwer, 1945,  p.240.

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