Cheguei à Missa atrasado, e agora?
Quando nos atrasamos para a Missa dominical, qual é o critério para saber se chegamos muito tarde? Se perdemos o Evangelho, temos a obrigação de ficar para a Missa seguinte? O que fazer se a Missa a que chegamos atrasados for a última do dia?
Quando nos atrasamos para a Missa dominical, qual é o critério para saber se chegamos muito tarde? Quando eu era criança, disseram-me que não era permitido perder a leitura do Evangelho. Posteriormente, soube que não era permitido perder o ofertório. Se perdemos o Evangelho ou o ofertório, temos a obrigação de ficar para a Missa seguinte? Ou temos apenas de assistir à parte que perdemos? O que deveríamos fazer se a Missa a que chegamos atrasados fosse a última do dia? (Um leigo)
Tenho uma paroquiana que frequenta a Missa diária e chega na hora da comunhão. Perguntei por que ela não assiste à Missa completa. Ela disse que tenta acordar mais cedo, mas não consegue. Então, disse a ela que, de acordo com a doutrina da Igreja, não podemos receber a Comunhão se perdermos a leitura do Evangelho. A Igreja nos ensina que devemos participar de toda a liturgia quando vamos à Missa. Poderia me ajudar e indicar qual trecho do Código de Direito Canônico trata das regras para receber a Eucaristia neste caso? Espero que possa me ajudar, pois não consigo encontrar o parágrafo específico (Um padre).
O que o direito canônico diz a respeito de cada uma dessas questões? Absolutamente nada. Não há nenhuma menção a elas no Código de Direito Canônico. Isso explica por que o padre em questão não conseguiu “encontrar o parágrafo específico”.
No entanto, isso não significa que seja impossível responder a elas. A teologia moral católica pode ser facilmente aplicada aqui, e esta é uma das razões por que o Código não precisa tratar dessa situação. Há outras boas razões pelas quais o direito canônico não se pronuncia sobre chegar atrasado à Missa, algo que analisaremos em breve.
O Cânon 1247 nos diz o que nós católicos já sabemos: somos obrigados a assistir à Missa aos domingos e dias de preceito. Portanto, o pressuposto lógico é que, se a Missa dominical começa às 9h30min, por exemplo, devemos chegar antes disso para poder estar presentes durante a Missa inteira.
Mas, como todos sabemos, a vida real nem sempre funciona assim. Por milhões de razões (falarei disso mais adiante), podemos nos dar conta de que entramos na igreja às 9h35min ou mesmo às 10h. O que temos de fazer, então? É minimamente razoável que os católicos suponham haver alguma “regra” sobre isso — como as supostas “regras” mencionadas por nosso leitor leigo, as quais diriam respeito à chegada antes do Evangelho ou do ofertório. Na verdade, tais regras não existem.
Porém, antes que você critique a Igreja por não estabelecer regras para essa situação, pense no seguinte: o que aconteceria se a Igreja Católica dissesse oficialmente aos fiéis que, por exemplo, “o preceito é cumprido quando o fiel chega antes do Evangelho nas Missas dominicais e em dias de preceito”?
O efeito colateral que surgiria rapidamente dessa declaração é fácil de prever. Inúmeros católicos que até agora se preocuparam em chegar à igreja antes do início da Missa dominical concluiriam que não é necessário fazê-lo, já que basta chegar com alguns minutos de atraso. Muitas pessoas decidiriam de forma equivocada que não há problema em perder partes da Missa anteriores ao Evangelho, o que equivale a pensar que elementos como o ato penitencial e o Glória não são importantes — do contrário, por que a Igreja diria que podemos chegar depois do término dessas orações?
Porém, antes que você critique a Igreja por não estabelecer regras para essa situação, pense no seguinte: o que aconteceria se a Igreja Católica dissesse oficialmente aos fiéis que, por exemplo, “o preceito é cumprido quando o fiel chega antes do Evangelho nas Missas dominicais e em dias de preceito”?
O efeito colateral que surgiria rapidamente dessa declaração é fácil de prever. Inúmeros católicos que até agora se preocuparam em chegar à igreja antes do início da Missa dominical concluiriam que não é necessário fazê-lo, já que basta chegar com alguns minutos de atraso. Muitas pessoas decidiriam de forma equivocada que não há problema em perder partes da Missa anteriores ao Evangelho, o que equivale a pensar que elementos como o ato penitencial e o Glória não são importantes — do contrário, por que a Igreja diria que podemos chegar depois do término dessas orações?
Em muito pouco tempo, os sacerdotes veriam que, no horário marcado para o início da Missa, a igreja estaria praticamente vazia, com a maioria dos fiéis a entrar durante as leituras (e a distrair todo o mundo). Em reação, alguns sacerdotes passariam a esperar alguns minutos para começar a Missa, mas quando os paroquianos se dessem conta disso, chegariam ainda mais tarde. No final das contas, os horários agendados para as Missas não teriam mais sentido!
Para piorar, os católicos que tentavam em vão chegar à Missa pontualmente, mesmo atrasando alguns minutos, seriam encorajados a chegar quando quisessem. Pensando em chegar à igreja logo antes do Evangelho, poderiam em vez disso chegar durante a recitação do Credo.
Em suma, o estabelecimento de regras a respeito do atraso para a Missa criaria uma “bola de neve” e causaria mais problemas do que resolveria outros. Quando uma regra deixa de ser absoluta, não há como voltar atrás. Portanto, quando a Igreja nos diz que precisamos ir à Missa aos domingos e dias de guarda, ela quer dizer apenas isso.
Mesmo assim, como foi dito acima, muitos católicos realmente chegam atrasados à Missa por diferentes motivos, e eles gostariam de receber alguma orientação! Ironicamente, esta frase contém uma expressão decisiva (“por diferentes motivos”), algo que quase sempre é negligenciado nessas discussões. Por que chegaram tarde? Qual é a razão de não conseguirem chegar antes do início da Missa? Este é um ponto fundamental, porque é aqui que entra em jogo a teologia moral.
Este fato é inegável: às vezes, acontecem coisas que realmente não conseguimos prever ou controlar, fazendo-nos chegar atrasados à Missa. O carro para de funcionar no meio do caminho; o bebê vomita na mãe justamente quando se está na porta de casa, obrigando-a a correr de volta para dentro de casa e trocar de roupa; há uma colisão entre vários carros na via principal, forçando todos a pegar um caminho mais longo e indireto; um médico está a caminho da Missa e interrompe o percurso para ajudar uma pessoa que desmaiou na calçada; o ônibus que sempre é usado para chegar ao destino não passou em determinado dia etc.
Se nos esforçarmos com sinceridade e da melhor maneira possível para chegar a tempo à igreja, e se algo verdadeiramente inesperado acontecer e provocar nosso atraso, qualquer teólogo competente dirá que não podemos ser responsabilizados moralmente por isso. Invariavelmente, advogados dirão a mesma coisa na esfera legal, e pelas mesmas razões: se não soubéssemos de modo algum que aconteceria X, e se não pudéssemos fazer nada a respeito disso, então, como regra geral, não poderíamos ser responsabilizados. Portanto, “punir” pessoas que chegam atrasadas à Missa por razões desse tipo não faz sentido algum. E leis bem fundamentadas devem ser razoáveis por definição.
É claro que essa moeda tem dois lados. Se apertarmos o botão de soneca do despertador, ou se ficarmos enrolando em casa para ver mensagens antes de ir à igreja, ou se demorarmos demais em nosso caminho para a Missa… então a culpa do atraso seria claramente nossa. É tentador nos esquivar da responsabilidade. (“Mas temos filhos!” é uma desculpa muito popular, como se não soubéssemos de antemão que temos de acordar mais cedo e/ou cutucá-los de forma mais insistente para que se arrumem para a Missa a tempo.)
Uma regra prática óbvia é a seguinte: quando descobrimos a que horas temos de acordar/sair de casa para chegar pontualmente à igreja — fazendo concessões razoáveis para coisas aleatórias que podem acontecer no trajeto e nos atrasar —, então não deveríamos acordar/sair de casa depois desse horário. É assustadoramente fácil encontrar católicos que se atrasam para a Missa semana após semana pelas mesmas razões, algo que eles naturalmente têm condição de prever. (Curiosamente, essas mesmas pessoas se esforçam para chegar pontualmente ao aeroporto quando estão de férias.)
Quando analisamos dessa perspectiva um caso de atraso na Missa dominical, fica claro de imediato o que é necessário fazer para reparar essa situação (se é que há necessidade de fazer algo). Quem não tem culpa não tem motivo para ficar se punindo; quem tem culpa, naturalmente deve se redimir. Por isso, se agora voltarmos às perguntas do nosso leitor leigo, fica evidente que a resposta para todas elas é: “Depende”.
O bom senso determina que, se chegarmos atrasados à Missa — mesmo que não tenhamos culpa — a ponto de perder boa parte dela, deveríamos ir em outro horário. Em grande medida, isso pode tornar-se um juízo subjetivo. A devoção e o amor a Deus impelem muitos católicos a permanecer durante a Missa seguinte ou durante parte dela porque assim o desejam — uma atitude digna de louvor a ser encorajada, mas que não constitui uma “regra”.
Repare que, até o momento, falamos sobre chegar atrasado à Missa nos dias em que ela é obrigatória. A assistência à Missa em dias de semana comuns não é obrigatória, embora, naturalmente, seja louvável fazê-lo. Portanto, se chegamos atrasados à Missa em dia de semana (ainda que sejamos inteiramente culpados), qual é a consequência? Nenhuma. É claro, pode ser frustrante para um sacerdote, como o da pergunta, ver um paroquiano entrar tarde na igreja e chegar atrasado à Missa diária dia após dia; mas, a rigor, essa pessoa não está fazendo nada errado do ponto de vista legal. Afinal, o que é preferível: chegar tarde à Missa diária ou não ir à Missa diária?
Como indicam as duas perguntas acima, há uma incompreensão comum segundo a qual atrasar-se para a Missa por qualquer razão implicaria algum tipo de punição. Mas, como acabamos de ver, trata-se de má teologia, já que não devemos ser punidos quando realmente não cometemos nenhum erro. Particularmente, a noção de que “não devemos receber a Sagrada Comunhão” se (por qualquer motivo) nos atrasarmos para a Missa, não possui nenhum fundamento sólido na teologia sacramental.
O Cânon 843, §1, afirma claramente que não se pode negar os sacramentos aos fiéis (1) “que oportunamente os pedirem”, (2) “se estiverem devidamente dispostos” e (3) se não houver nenhuma lei que os impeça de recebê-los. Um exemplo concreto pode servir para ilustrar como o Cânon 843, §1, se aplica a este caso.
Imagine que normalmente você vai à Missa dominical bem cedo após um plantão noturno no hospital, e que costuma chegar pontualmente, sem nenhum problema, mas esta semana alguma emergência incomum impediu que você saísse do trabalho a tempo, fazendo-o chegar tarde à Missa. Você está preparado para receber Nosso Senhor na Eucaristia com devoção (então está “devidamente disposto”), não foi excomungado nem recebeu outra sanção semelhante (ou seja, “pelo direito” não se encontra impedido de receber a Comunhão), então você se aproxima do sacerdote durante a distribuição da Eucaristia aos fiéis (um momento oportuno). Em tais circunstâncias, não há absolutamente nenhuma razão, teológica ou canônica, para que lhe seja negada a Sagrada Comunhão — ainda que você tenha se atrasado para a Missa. O que o padre da pergunta acima vê como “doutrina da Igreja” não passa de fantasia.
Dito isto, existem situações em que há uma verdadeira conexão entre deixar de receber a Comunhão e chegar atrasado à Missa. É triste, mas é verdade que alguns católicos entram na igreja 30 ou 40 minutos mais tarde, como se estivessem passeando, e quando tomam assento começam imediatamente a bater papo ou a brincar com o telefone celular, não fazendo nenhum esforço para acompanhar a Missa (ou o que resta dela).
Obviamente, tais pessoas não têm a intenção de ir à Missa para mostrar a Deus todo-poderoso a reverência que lhe é devida. Na verdade, muitas vezes é até difícil entender por que essas pessoas se preocupam em ir à igreja. Embora não possamos acessar a mente e o coração delas para saber o que acontece lá dentro, sua conduta exterior oferece todos os sinais de que elas não estão “devidamente dispostas” para receber a Eucaristia, como diz o Cânon 843, §1; portanto, elas não deveriam recebê-la.
Neste caso específico, o atraso na chegada à Missa é apenas um dos muitos sintomas que revelam uma completa falta de fé e reverência. Mas afirmar que católicos desse tipo “chegam atrasados à Missa” e “não deveriam receber a Comunhão” é algo bem diferente de afirmar de modo absoluto que chegar tarde à Missa e abster-se de comungar são coisas que sempre andam juntas. Não andam.
Então, que lição podemos tirar de tudo isso? Antes de mais nada, temos o dever de fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para chegar pontualmente à Missa de preceito. Ponto final. Quando não nos esforçamos adequadamente e, por essa razão, nos atrasamos, somos culpados e precisamos fazer algo para reparar a falta diante de Deus (a depender da duração do atraso, a melhor coisa a fazer é ir a outra Missa).
Quando tomamos todas as precauções razoáveis e reservamos tempo suficiente para chegar à igreja antes do início da Missa, mas algo realmente imprevisto acontece e nos faz chegar atrasados, então não somos moralmente responsáveis por isso. Ainda que decidamos fazer alguma reparação diante de Deus, permanecendo durante toda a Missa seguinte ou parte dela — supondo, naturalmente, que haja outra! —, em sentido estrito podemos considerar que não estamos moralmente obrigados a fazer isso.
Quanto à recepção da Sagrada Comunhão, não existe nenhuma conexão automática entre isso e chegar pontualmente à Missa. Se estivermos devidamente dispostos a receber Nosso Senhor, então devemos recebê-lo. Qualquer sacerdote que tentasse impedir alguém de comungar apenas porque a pessoa chegou atrasada à Missa, sem que haja nenhum outro motivo correlato, violaria inequivocamente o direito dela a receber os sacramentos.
Já deve estar claro que a Igreja não errou ao não estabelecer nenhuma regra oficial a respeito da chegada pontual à Missa em dias de preceito. Temos o dever de fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para garantir que chegaremos pontualmente, sempre conscientes de que, às vezes, podem ocorrer imprevistos sobre os quais não temos nenhum controle e pelos quais não podemos ser culpados.
Fonte: Cathy Caridi | Tradução: Equipe Christo Nihil Præponere