SANTO DO DIA – 23 DE NOVEMBRO – SÃO CLEMENTE I
Papa e mártir (+101)
Temos preciosas informações do terceiro sucessor de são Pedro na sé apostólica de Roma – nomeado na prece eucarística -, em um escrito de santo Irineu no ano 180: Clemente “havia visto os apóstolos e conversado com eles, tinha ouvido o próprio som de sua prédica e tivera a sua tradição sob os olhos”.
É sempre Irineu quem nos informa sobre a célebre carta escrita pelo papa à igreja de Corinto – um importantíssimo documento sobre a Igreja primitiva e sobre a reconhecida autoridade do papa no governo e na direção espiritual e moral das várias comunidades. Ei-la: “Trar-nos-íeis júbilo e alegria”, escrevia o papa Clemente à Igreja de Corinto, dividida por um cisma interno, “se, curvando-vos às advertências por nós escritas com a graça do Espírito Santo, abandonásseis a ilícita paixão da inveja”.
Este é o importante legado deixado pelo papa Clemente. Dele nos fala ainda a basílica constantiniana, construída nas vertentes do monte Célio, provavelmente sobre as ruínas de sua casa, onde são conservadas suas relíquias, transportadas da Criméia, no século IX, por são Cirilo, o grande apóstolo dos eslavos.
Segundo uma antiga tradição, o papa Clemente foi relegado pelo imperador Trajano a uma cidade do Quersoneso, junto com muitos outros cristãos, condenados a trabalhos forçados nas minas de mármore. Sua presença foi de grande conforto para os prisioneiros, até que o próprio imperador encarregou um magistrado de truncar sua atividade com uma exemplar condenação capital, caso Clemente não renegasse publicamente a Cristo, sacrificando aos deuses de Roma. Esta tradição é bem conhecida.
Assim, quando são Cirilo esteve na Criméia, em 868, para evangelizar os Cazares, foi-lhe indicada uma fossa dentro da qual se tinham descoberto ossos humanos junto com uma âncora; este particular induziu Cirilo a crer ter encontrado as relíquias do santo pontífice. Mais tarde, Cirilo levou as relíquias para Roma, a fim de serem guardadas na basílica a ele dedicada.
Do livro “Os santos e os beatos da Igreja do Ocidente e do Oriente”, Paulinas Editora.
São Clemente, Papa e Mártir
Enquanto a ruína de Jerusalém e do templo acarretava a ruína da sinagoga e do sacerdote de Aarão, os pontífices da Igreja cristã se sucediam, em Roma, na Cátedra eterna de São Pedro.
São Lino, morto depois de um pontificado de quase doze anos, a contar da época em que São Pedro o encarregou de governar a Igreja romana em sua ausência, e de somente dois depois do martírio do mesmo apóstolo, subiu ao pontificado São Clemente, o mesmo do qual São Pedro fala na epístola aos Filipenses.
Temos do Papa São Clemente uma carta aos cristãos de Corinto. Escreveu-a por ocasião dum cisma assaz grave, excitado naquela igreja por um pequeno número de sediciosos, que enciumados dalguns sacerdotes de grande mérito e virtude comprovada, não cessaram de os perseguir. E, enquanto não os viram, pela calúnia e os artifícios, despojados das dignidades, não deram tréguas.
O ciúme e a inveja sempre, em todos os tempos, geraram grandes males, diz ele.
Além dos exemplos da antiguidade, cita o de apóstolos perseguidos, que acabaram recebendo a coroa dos mártires, tudo devido ao ciúme, à inveja. Cita também, na carta, o caso de duas damas ilustres, Danaide e Dirce, que por inveja, foram gravemente maltratadas, e chegaram à vitória.
Deveis fugir das dissensões, das disputas, e abraçar a penitência, praticar a caridade, a humildade, a doçura, para conservar a boa ordem nas funções da igreja, evitando agitações e respeitando a hierarquia eclesiástica, submisso, cada qual, aos legítimos pastores. (…)
Depois doutras considerações, prossegue:
Considerai os que fazem a guerra: com que ordem, com que bravura e submissão executam ordens do comando. Nem todos são generais, nem tribunos, nem centuriões, nem oficiais de grau. Cada qual, no posto que lhe é peculiar, executa ordenadamente o que lhe compete executar: acatam todos o que do rei e dos chefes emana. Os grandes não podem subsistir sem os pequenos, os humildes, nem os pequeninos sem os grandes. É recíproca harmonia que resulta a utilidade comum. Devemos observar pontualmente o que nos foi prescrito por Deus. É Ele que estabelece, por suprema vontade, em que tempo, em que lugar e por quais pessoas é preciso fazerem-se oblações sagradas e celebrar os divinos ofícios: as oferendas dos que são puros, santos e agradáveis aos olhos do Pai, que em tudo se conformam com a vontade divina. Aos prelados são designadas funções próprias. Aos sacerdotes, o competente lugar, Tudo, então, marchará bem.
Depois acrescenta que, para estabelecer a ordem, foi Jesus Cristo enviado por Deus, e os apóstolos por Cristo Jesus, depois da descida do Espírito Santo.
Nota-se nesta carta que, falando da ressurreição dos corpos, São Clemente cita, entre outros exemplos, tirados da natureza, o da fênix, a fabulosa ave que, segundo a mitologia, vivia nãos e anos e, queimada, renascia das cinzas mesmas. Uma coisa mais notável ainda, é que, falando da harmonia que reina no universo, refere-se abertamente aos antípodas, ou seja, à parte do globo que se designou Novo Mundo. E continua, para exortar à paz:
Os céus, movendo-se à vontade do Criador, são-lhe submissos em paz. O dia e a noite, sem jamais embaraçar um na outra, cumprem a carreira que Ele lhes prescreveu. O sol, a lua, todo o conjunto dos astros, segundo a ordem que jamais transgridem, rolam nas esferas imensas que lhes foram traçadas. Nos tempos marcados pela Vontade, a terra, sem hesitar, sem mudar nos decretos, apresenta o seio fecundo e carregado de alimentos para os homens, os animais e todos os seres que a habitam. Os abismos impenetráveis, os segredos do mundo subterrâneo são regidos pela mesma lei. Conforme às ordens do Supremo, a profundeza do mar, soerguida, em toda a extensão, não transpõe as barreiras que o contém. Deus ordena, e ele obedece: Diz-lhe “Tu virás até aqui. Aqui as ondas se quebrarão sobre si mesmas”. O oceano, impermeável ao homem, e tudo o que nele existe, governam-no as mesmas leis do soberano Mestre. A primavera, o verão, o outono e o inverno sucedem-se na paz um com o outro. Atendendo o tempo prescrito, os ventos cumprem o ministério que devem cumprir, sem obstáculos. As fontes, inesgotáveis, criadas para entreter a saúde e a vida, obedecem ao homem, sem jamais falar, águas abundantes. Enfim, até na mais pequena assembléia de animais reina a paz e a concórdia. Tudo é paz, tudo é ordem. Assim o quer o Criador e o Mestre de todas as coisas, que se mostra bondoso com tudo, mais ainda conosco, os homens, aos quais deu o Filho, Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem a glória e a majestade nos séculos dos séculos. Amém.
Depois dessa carta foram enviados a Corinto cinco legados: Cláudio, Efebo, Valério, Viton e Fortunato, sem dúvida a fim de que, pela prudência, zelo e sabedoria, trabalhassem ainda de viva voz para acalmar as dissensões, e restabelecessem naquela igreja a tranquilidade e a paz.
Também aos romanos roga como aos de Corinto:
Diligenciai a fim de que nos tragam o mais cedo possível, boas novas de vossa paz e de vossa concórdia, coisas que, naturalmente, desejamos com vivo ardor.
Esta carta foi escrita depois da morte de Nero, e antes da destruição de Jerusalém e do templo. Nela, entrevê-se que os sacrifícios da manhã e da noite ainda se ofereciam em Jerusalém, no adro do templo, ao pé do altar, e depois do pontífice e dos ministros terem atentamente examinado a vítima. Nela também se fala da perseguição de Nero, onde São Pedro e São Paulo sofreram o martírio com um grande número de fiéis.
Duas outras cartas de Clemente foram descobertas nas quais fala das vantagens da virgindade. Diz São Jerônimo:
Nas epístolas que Clemente, sucessor de São Pedro, escreveu às virgens, quase em todas elas se estende as excelências da virgindade.
Foi o Papa São Clemente que enviou às Gálias, São Dionísio, primeiro bispo de Paris. São Clemente, discípulo e sucessor de São Pedro, recebeu, como ele, a coroa dos mártires. Foi exilado no Quersoneso, durante a perseguição de Trajano: mais tarde, precipitado ao mar com uma âncora atada ao corpo; e depois transportado para Roma, sob o pontificado de São Nicolau, o primeiro. Jaz na igreja que lhe tem o nome.
(Vida dos Santos, Padre Rohrbacher, Volume XX, p. 204 à 209)