A Igreja Católica na Nicarágua sofre grave perseguição pelo governo comunista e pede socorro. A polícia nicaraguense entrou no bispado de Matagalpa e levou Monsenhor Rolando Álvarez e oito de seus companheiros.
A polícia da Nicarágua invadiu a casa episcopal da diocese de Matagalpa e prendeu o bispo, dom Rolando Álvarez, e os padres, seminaristas e um leigo que o acompanhavam.
Na manhã de hoje (19) a diocese de Matagalpa publicou através das suas redes sociais que “neste momento a Polícia Nacional entrou na Cúria Episcopal da nossa diocese de Matagalpa”.
A ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, confirmou que o bispo foi preso pela polícia nicaraguense e colocado em um veículo. Não há informações sobre para onde ele foi levado.
As outras oito pessoas que estavam com ele dentro da cúria diocesana desde 4 de agosto, dia em que foram cercadas e trancadas pela polícia de Ortega, foram transferidas em veículos diferentes.
Poucas horas antes, Álvarez postou em sua conta no Twitter a mensagem: “Vamos nos preocupar em usar o traje de festa no Reino de Deus”.
A Igreja na Nicarágua vem sendo alvo de perseguição por parte do presidente Daniel Ortega desde que, em 2018, houve protestos contra o governo. Ortega, ex-líder guerrilheiro de esquerda, venceu as últimas quatro eleições no país. E última delas foi denunciada como injusta por observadores internacionais. Sete candidatos de oposição foram presos e impedidos de concorrer. Com um intervalo entre 1990 e 2007, Ortega está no poder desde 1979.
Na Paróquia Santa Lucía, que há alguns dias sofre o cerco policial, os fiéis se reuniram de madrugada para proteger seus padres e impedir que sejam sequestrados.
Leia também
Perseguição religiosa na Nicarágua: Bispo enfrenta governo comunista com o Santíssimo Sacramento
Prisão de bispo foi para “recuperar a normalidade” na Nicarágua, diz a polícia
A Polícia Nacional da Nicarágua disse que a prisão do bispo de Matagalpa, dom Rolando Álvarez, na madrugada de hoje foi feito para “recuperar a normalidade da Cidadania e Famílias de Matagalpa”.
Em comunicado divulgado hoje de manhã, a polícia justificou a invasão feita por volta das três da manhã à casa episcopal de Matagalpa, na qual o bispo teria continuado com “atividades desestabilizadoras e provocativas”. A acusação repete a que foi feita por Rosario Murillo, vice-presidente e mulher do presidente Daniel Ortega, ex-líder guerrilheiro que soma 29 anos no poder na Nicarágua.
A Polícia, que desde 4 de agosto mantinha o bispo e um grupo de padres, seminaristas e leigos trancados e incomunicáveis dentro de casa, disse que “durante vários dias esperaram com muita paciência, prudência e senso de responsabilidade uma comunicação positiva da diocese de Matagalpa, que nunca aconteceu”.
Segundo o comunicado, o bispo de Matagalpa e as outras oito pessoas que permaneceram com ele dentro da casa, entre padres, seminaristas e um leigo, “foram transferidos, com respeito e observância de seus direitos, para a cidade de Manágua para investigações legais”.
“O Senhor Bispo se mantém em proteção domiciliar nesta capital e pôde se encontrar com seus familiares esta manhã”, diz o comunicado
A polícia também disse que o arcebispo de Manágua e vice-presidente da Conferência Episcopal da Nicarágua, cardeal Leopoldo Brenes, visitou dom Rolando Álvarez esta manhã “e ambos conversaram muito”.
A Polícia Nacional disse que na casa episcopal de Matagalpa “permanece, como Autoridade Eclesial e sem quaisquer restrições policiais ou de mobilidade, o Senhor Vigário, monsenhor Oscar Escoto”.
A arquidiocese de Manágua ainda não emitiu um comunicado oficial sobre o encontro entre o cardeal Brenes e dom Álvarez.
A advogada nicaraguense Martha Patricia Molina Montenegro, membro do Observatório Pró-Transparência e Anticorrupção, disse à ACI Prensa, agência em espanhol do grupo ACI, o governo de Daniel Ortega e Rosario Murillo “é capaz de tudo” e “sempre gerará o máximo de dano possível”.
Montenegro destacou a arbitrariedade da invasão da Polícia Nacional à casa episcopal de Matagalpa, que viola a Constituição e o Código Processual Penal, que estabelecem limitações à prisão domiciliar e à invasão domiciliar, que só pode ser feita “entre as seis da manhã e as seis da tarde”.
Montenegro disse que Álvarez e os padres, seminaristas e leigos que estavam cercados pela polícia desde 4 de agosto “passaram 15 dias sequestrados, não detidos”.
“A polícia está agindo como um grupo criminoso que não se submete ao estado de direito e mais uma vez deixa claro que a Nicarágua é uma ditadura onde eles agem de acordo com o capricho e o estado de espírito do presidente Daniel Ortega e sua consorte”, disse Montenegro.
Montenegro disse à ACI Prensa que “a ditadura de Ortega-Murillo procede de forma arbitrária porque sabe que se usar os canais legais não teria qualquer base legal, porque todos os crimes que são atribuídos a cidadãos inocentes são falsos”.
“O ‘sistema de justiça’ na Nicarágua é uma fábrica de invenções e falsidades para causar o maior dano possível”, disse, acrescentando que “Ortega e Murillo estão no poder não pelo apoio do povo, mas porque têm à sua mercê a Polícia Nacional e o Exército Nacional, que já demonstraram que estão dispostos a matar em nome do casal presidencial”.
“Ortega não teme ninguém”
Montenegro, que é autora de um relatório que informa sobre os mais de 190 ataques que a Igreja Católica sofreu desde 2018 sob a ditadura, destacou que “Ortega não teme ninguém”.
“Isso ficou claro com o aumento da intensidade da repressão.”
Montenegro lembrou que a ditadura de Ortega “ordenou o assassinato de mais de 350 nicaraguenses”, referindo-se aos mortos para reprimir os protestos pacíficos de 2018, e disse que o governo “enviou ao exílio mais de 200 mil”.
O governo, continuou, tem “190 presos políticos”, fechou todos os meios de comunicação, confiscou e descumpriu todas as normas internacionais e sabe que, independentemente do que fizer, se fortalece mais”.
Montenegro também criticou a comunidade internacional e sua relação com a ditadura de Ortega, porque por um lado “a condena, mas por outro continuam financiando e concedendo-lhe empréstimos milionários, que são usados para reprimir e não para investir em projetos sociais”.
“A vitória será dada pelo Senhor”
Montenegro diz que “a dor gerada pelo ataque à Igreja Católica é inexplicável”.
“Fora do contexto jurídico, que é meu ramo, posso dizer-lhes que essas arbitrariedades e ataques à Igreja nos uniram mais como cristãos”, continuou, “ontem éramos mais de 3,5 mil famílias rezando o Santo Rosário na companhia de dom Rolando José, através das redes sociais e milhares mais que se conectaram de outros sites”.
“Estamos fortalecidos com aquela paz e tranquilidade que só o Espírito Santo proporciona”, disse.
“Não há poder humano que possa acabar com essa ditadura nefasta e criminosa. A vitória será dada pelo Senhor”, concluiu.
A última publicação na conta do Twitter de dom Rolando Álvarez, poucas horas antes de ser sequestrado pela Polícia Nacional, relembrou precisamente o Evangelho: “Vamos nos preocupar em usar o traje de festa no Reino de Deus”.